dema
Ao revés de vir à luz,
irrompi-me projétil deflagrado contra o insondável universo.
No espaço de obscuridade esparso
fricciono coriscante a trilha do destino que a mim traço.
Tenho por missão o “faça-se!”
Destemo o indefinido,
ou estaria a renegar a humana gênese,
cuja essência perfaz-se no planear-se
e no autóctone executar-se.
Não me apavora a morte,
pois entreposto indeclinável do existir.
Antes fugir da vida,
Senhora do sucesso e do fracasso.
Mas desertar da batalha é
desmerecer–se a mortalha.
Abomine-se o “Laissez faire”,
tremule-se o estandarte “Carpe diem!”
Que o agir encha meu farnel pra desjejum
e merenda na jornada.
Fora meu ser, nada a temer.
Mas um receio estranho exsurge
e se agiganta,
parece não ter fim:
é o medo de mim.
......
A crítica:
O Prof. Eduardo Humberto de Carvalho, expert em Literatura, Gramática e Linguística, assim se manifestou:
"Ademar, fiz algumas “intromissões” no poema “Medo”. Ei-las:
Há, entre tantos, dois traços essenciais que demarcam a construção poética de “Medo”: a seleção vocabular, que tipifica o neoclássico inutilia truncat, e a precisão. O primeiro, envereda-se, a meu ver, intencionalmente, para o campo da existência humana assaz pertinente em verbetes como “vir à luz”, “universo”, “espaço”,”destino”, “indefinido”, “gênese”, “essência” presentes na primeira estrofe e que, irremediavelmente, sucedem-se espalhados nas duas subseqüentes cujo teor semântico não se desvia do plano traçado pelo poeta – destemor diante da morte contrapondo-se a um temor de si mesmo; o segundo, caracteriza-se pela habilidade de sintetizar em três estrofes a impassibilidade filosófica diante do medo, abdicando-se do sentimentalismo piegas pela contenção da subjetividade.
O autor claramente engendra a sua poesia com labor e persistência; preocupa-se com a organização da mesma através de versos livres e concisos. O resultado final é uma composição poética concretizada sob matizes de contenção da musicalidade fácil e o repúdio explícito do exagero muito comum em temáticas de natureza existencialista.
Por fim, o autor não foge à sua jornada: enche o seu “farnel” para enfrentar a sua jornada de maneira serena. Não há indagações sobre a brevidade da vida; não há tampouco questionamentos sobre o sentido da existência e da incompreensão humana, embora estejam presentes nas entrelinhas por uma razão muito simples: o poeta, apesar de “receio estranho” que “exsurge” do seu interior, estanca-o porque está vigilante para enfrentar o maior dos inimigos – ele próprio.
Obs: Se não julgá-las pertinentes, pode refutá-las. "
Não pude deixar de responder:
"Meu caro Eduardo,
Muito lhe agradeço pela intromissão encomendada no texto posto sob sua apreciação. Para ser sincero, acho melhor a crítica do que o poema. De fato, há redundância e um certo malabarismo para expressão da temática.
Não tenho o que refutar, apenas a considerar a riqueza que se obtém dependendo de diferentes prismas pelos quais o texto é apreciado.
Você o analisa sob o aspecto literário, ressaltando qualidades e ranhuras que nele se apresentam. E o faz de maneira clássica, em alto estilo e irrefutável, qualidades que inerem à sua maneira de ser.
De meu turno, muito embora preocupado com a forma, intentei repassar a ideia existencialista do ser humano, no caso, personalizado no autor, que se vê como um "dado" lançado no universo, cuja essência vai se construindo com a execução do projeto que faz para si. Como nada se encontra definido, como nenhuma garantia há de sucesso ante o livre planear e executar de seu projeto, o grande medo deriva exatamente do exercício dessa liberdade. O homem há de realizar-se, ou não, em decorrência do que tiver construído por si mesmo. A responsabilidade pelo sucesso ou fracasso é toda sua. "