quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Ai de ti, Haiti.

dema

São dezesseis e cinquenta e três.
Poseidon sacoleja a ilha e põe a cidade ao chão.
Milhões no entorno do epicentro.
Ecoa pelo Caribe o haitiano grito
─ um reboar sismo ao sismo
a romper insulares tímpanos.
“Ai de ti, Haiti!
Porto Príncipe, ai de ti”.
Horrível terá sido o teu pecado!
O desmando dos comandos?
A miséria dos sugados?
Tendas, edifícios, casas e casebres, tudo amontoado.
Nada escapa, nem o Paço Maioral,
alvo e amassado pão,
símbolo da exploração.
Falso sonho, é real.
A cruz remanesce à catedral.
Coage o sobrevivo a crer
que o sofrimento há de ser total.
A massa apodrece na praça,
oitenta mil na vala de graça.
O desespero condena ao saque.
Efeito do baque?
Do que no morro
restara de pé
uma casa verde destoa
(pede socorro),
sabe-se que não à toa:
esperança e fé,
todas ressurgirão,
inda que ora a desolação
no estarrecido olhar nativo persista.
Ah, cadê o turista?

Entre palhoças, porcos e lama,
vestida de branco, fita no cabelo, uma dama,
a menina-anjo ébano passeia.
Busca o lixão, pois, sonhando, anseia,
(quem sabe?) encontrar
a senha de acesso aos hotéis beira-mar,
onde ausentes lata e lixo,
quando dia ou anoitece,
o luxo resplandece.


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