quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Utopia vã?

dema

Muitas vezes imploro a Platão
que me “linque” com o hiperurânio,
sem ideias neste plano-chão,
submeto-me a ser seu conterrâneo.

Na práxis, quero achar a verdade,
dela, porém, nem à sombra chego,
um turvo mar cobre a sociedade,
tal que o mofino perde o sossego.

Quisera agir com mil peripécias,
plantar prazer e divertimento,
instigar o morno contra a inércia,
no aluado, incutir pensamento;

pintar, quem sabe, belas paisagens,
ler sonetos ao brilhar de estrelas,
dar aos céticos novas visagens
e estimulá-los pra não perdê-las.

Quisera, enfim, ser o vento forte
que das palmeiras o dorso dobra,
varrendo as águas do sul pro norte,
e toda a mágoa que nos soçobra.

Quiçá edificar um mundo novo,
multicolorido e mais irmão,
com a justiça imanente ao povo,
jorrando amor cada coração.

Constrói meu hoje crer no impossível
para o amanhã ser menos temível.
Maluca espera sob minhas cãs?
Sonho em gaveta, utopia vã?





quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Sádica lua

dema

A aeronave singra o espaço matinal,
saudável esperma planeando perfurar a lua,
imagem bela no azul que cobre o parque.
Porque descabe, já se sabe,
passa ao lado, lá se vai.
O semi-aro prateado olha-me sorriso largo:
─ Tô que tô. Sô que sô, quem me quer, que me pegue!
(Não é que negue, mas alguém já lhe pisou).
Enquanto isso, fétida e imarcescível,
a “gangue” dilapida o tesouro - puro sangue nosso:
aos cubanos um “porto seguro”,
pois containers entopem Santos.
Se os estádios se atrasam,
bilhões extravasam.
Meu Deus, troque a senha do cofre
ou lá se vai a liquidez,
já pobres, morreremos da sordidez.
De sobejo, no fim do túnel falta luz.
Socorro, Jesus!
Cadê o ponto final desta cruz?
E a lua, por escárnio, ri, apimenta:
─ Aguennnnnta!

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sábado, 25 de janeiro de 2014

Fragmento

dema

Teus seios suados dão-me água na boca
e uma ânsia louca de te devorar,
de sorver, na fonte, o teu muco,
abundante suco ao desejo de amar.
Quem te fez não fui eu, mas um deus,
para os prazeres teus e meus...

Trevas e luz

dema

O que caminha nas trevas
não tem rumo certo,
ignora estar longe ou estar perto.
Não sabe onde o abismo
ou a serpente do deserto.
‘Stará exangue entre colchetes
quem atira no escuro,
pois, de bumerangue,
anda o ricochete.
Quão bom ser a estrela
que se guia à própria luz,
quiçá, então, o cometa ,
cuja vela acende em sol
por onde se conduz.
Melhor mesmo é ser a luz,
prescindente de novela,
tantas trilhas ilumina
e não precisa acender vela.
Talvez, por isso dissera
nosso grande irmão, Jesus:
do mundo, eu sou a luz.


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Paradoxo

dema

Loucura brota da lucidez,
já desamor vem d’ânsia de amar;
orgulho exsurge da pequenez,
saber me chega do  soletrar;
é a liberdade meu cativeiro:
o oposto em mim faz-me verdadeiro.

Broto do extremo e me queimo ao meio,
sou parte verme, parte supremo,
azul por fora, dentro vermelho,
meu maior medo é porque não temo;
santo de manhã, demônio à noite,
meu patrimônio, prazer e açoite,

Nasce a esperança no desespero
e só há morte depois da vida;
pra que haja ódio, há o amor primeiro,
após a chegada, a despedida.
Se de finitos é o infinito,
meu silencio eterno, eterno grito.

Em teus tristes olhos, ri alegria,
no amargo beijo, tão só doçura,
no cerne d’alma entrevi folia,
nos gestos meigos, muita amargura.
Fonte és de inverso ao meu universo,
sabor acre-doce nos meus lábios;

és o paradoxo dos meus versos
que, sempre, ao contrário, os li mui sábios.
Vi a timidez virar aventura,
vir, do teu silencio, um carnaval;
de tua presença fiz mi’a procura,
pois tua ausência traz-me tanto mal.

Loucura brota da lucidez,
já desamor vem d’ ânsia de amar;
orgulho exsurge da pequenez,
saber me chega do  soletrar;
é a liberdade meu cativeiro:
o oposto em mim faz-me verdadeiro.

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quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Peleja de pelo e pena

(Baladinha perfumada)
dema


Nenhum perfume de flor
cheira mais que o manacá,
exceção pro meu amor
quando vem me visitar.

Nas folhas fazem farfalhos
passarinhos no jardim,
saltam felinos dos galhos
de um alto pé de jasmim.

“Corre-voa” vira festa,
salta aqui, voa acolá,
(oh desafinada orquestra!)
penas sobem pelo ar.

Depois de pega renhida,
no chão resta u'a ave caída,
causa de sangrenta luta
dos peludos em disputa.

E de cá, neste mirante,
aguardo nova batalha,
pois se esta sanha é constante,
de hoje até amanhã não falha.

Entretanto não a quero
no meu pé de manacá,
contra seu perfume espero
meu amor vir disputar.



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domingo, 19 de janeiro de 2014

Sem escape


(Sambinha do colofão)
dema

Morre, todo mundo morre,
muitos morrem de tristeza,
enquanto outros de porre

Se não de morte matada,
pra velhice está marcada,
quando já nem Deus socorre.
Todo mundo morre, morre.

Grande parte por doença,
uns milhões por acidente,
é verdade, não é crença,
“bicho home” é imprudente.

Se a morte te rodeia,
não lhe mostres cara feia,
senão, sorrindo, a danada
vem e dá-te uma foiçada.

Não adianta sentir medo,
ninguém fica pra semente,
sabe-se, não é segredo,
só a morte é inclemente.

Pra que pensar em correr,
pois da morte não há escape,
caso tua carta valer,
sempre a dela será o zap.

Podes, sim, te preparar
pra ter um feliz final,
tua hora há de chegar,
faze o bem, evite o mal.

Vive a vida com alegria,
jamais fujas do prazer,
com certeza chega o dia,
o dia em que vais morrer.

Morre, todo mundo morre,
podes morrer de tristeza,
qu’eu vou morrer é de porre.




sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Folhas de outono


dema

Será não caíram as folhas no outono,
se no pátio rolam em pleno verão,
terão se esquecido ou foi por abandono
da mãe natureza naquela ocasião?

Quem sabe curtiam em transe a transa
contínua de amantes na fresca estação
ao sopro da brisa que a elas balança
e na sombra infla amor em cada coração.

Verão é de verde no mato e no mar,
de sol e de chuva, curtir e sonhar,
é tempo de férias, de relaxamento,
de praia, de riso, de contentamento.

Estranha-me ver folhas mortas ao chão
tocadas ao vento de chuva bravia,
pois não tive amores nas tardes vazias
do outono sem cores no meu coração.

Que venham o riso, a brisa e o sol,
que surja o amor pra ser meu arrebol,
depois a saudade a chegar quando outono,
alongando as noites vez perdido o sono.

Que seria a vida senão estações,
continuamente se alternam os momentos
e a todo instante as novas emoções
geram imprevistos mil deslumbramentos.

Estranha-me ver folhas mortas ao chão
tocadas ao vento de chuva bravia,
pois não tive amores nas tardes vazias
do outono sem cores no meu coração.
Que venham o riso, a brisa e o sol,
que surja o amor pra ser meu arrebol.


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sábado, 11 de janeiro de 2014

Sonhado amor


dema
(baladinha triste)

Hoje farei um poema,
homenagem ao meu amor.
Acontece, oh Deus (que pena!),
não sou mais que um sonhador.

Minha vida é sempre um sonho
cheinho de coisas boas,
pois me costumo enfadonho,
muito mais se ando à toa.

Quisera encontrar na vida
a tal da felicidade,
mas minh’alma tão sofrida
carece de piedade.

Quão triste o sofrer assim,
não gozar da vida mansa,
como a rosa no jardim
que jaz morta inda criança.

Desejei que Deus me desse
um cadinho de alegria.
Solidão me entristece,
não tenho uma Ana Maria.

Volto-me, então, ao papel
pra cumprir o meu destino,
príncipe sem Rapunzel,
sonhos de amor clandestino.

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sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Ovelhinha desgarrada


dema


No azul de infinito iluminado ao sol da tarde
desliza uma ovelhinha desgarrada.
Seu rebanho de algodão quiçá encubra o céu do oceano.
Aqui, feliz, parece, ela se vai sem plano “esmando”,
sem tempo de sentir a solidão...
O vento a desfaz.
Novamente o azul celestial invoca o incerto, o desconhecido.
No solo, bico ante pé, pé após bico,
a rolinha detona os incautos insetos sobre a grama.
Papo cheio, sobe à trave em busca do ninho.
No balanço da folha da palmeira
a orquídea tenta desabrochar segunda flor.
A vida para pra ver o parto...
depois segue com a brisa fresca e fugaz.
Tudo apraz.
Meu coração dispara. Percebo que, como a brisa,
minha vida passa.
A diferença é que sem graça.
Se eu pudesse, saltaria no infinito.
Pode ser que nem sentisse me esvaindo em brisa astral
no me juntar à ovelhinha desgarrada.


Dois males terrenos

dema

(Se a vida é patrimônio perdido, inexiste inimigo temido.)

Angústia e medo, dois males terrenos
dos quais a maldita nos libertará.
Nunca se ouviu de haver propalado
que alguém não se achasse sereno,
temendo encontrar d’outro lado
quem quer que o ameaçará.

Nada a perder do lado de lá,
se a vida, o melhor que há do lado de cá,
já for bem perdido a não mais se guardar.
Ter medo de que, angustiar-se por quê?
De vida futura que o está a aguardar?
Da justiça divina aplicável a você?

Se crente o for,
não espere favor,
viva ao bem merecer,
não haverá o que temer.


quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Ai de ti, Haiti.

dema

São dezesseis e cinquenta e três.
Poseidon sacoleja a ilha e põe a cidade ao chão.
Milhões no entorno do epicentro.
Ecoa pelo Caribe o haitiano grito
─ um reboar sismo ao sismo
a romper insulares tímpanos.
“Ai de ti, Haiti!
Porto Príncipe, ai de ti”.
Horrível terá sido o teu pecado!
O desmando dos comandos?
A miséria dos sugados?
Tendas, edifícios, casas e casebres, tudo amontoado.
Nada escapa, nem o Paço Maioral,
alvo e amassado pão,
símbolo da exploração.
Falso sonho, é real.
A cruz remanesce à catedral.
Coage o sobrevivo a crer
que o sofrimento há de ser total.
A massa apodrece na praça,
oitenta mil na vala de graça.
O desespero condena ao saque.
Efeito do baque?
Do que no morro
restara de pé
uma casa verde destoa
(pede socorro),
sabe-se que não à toa:
esperança e fé,
todas ressurgirão,
inda que ora a desolação
no estarrecido olhar nativo persista.
Ah, cadê o turista?

Entre palhoças, porcos e lama,
vestida de branco, fita no cabelo, uma dama,
a menina-anjo ébano passeia.
Busca o lixão, pois, sonhando, anseia,
(quem sabe?) encontrar
a senha de acesso aos hotéis beira-mar,
onde ausentes lata e lixo,
quando dia ou anoitece,
o luxo resplandece.