quarta-feira, 5 de agosto de 2009

TEENS IV - LIA - III CANTO

DEMA
Quantos anos há vives comigo, Só?
Não sou mais Don Juan,
aquele do coração de rosas.
A natureza purificou meu lirismo.
Tu, porém, me abates pouco a pouco,
me enches, me esvazias.
Teu amor me angustia.
Cansei-me rindo da maldade.
Minh'alma é hoje pedra
submersa em oceano de tristeza.
Quanto a ti,
não és mais a companheira de outrora,
o refúgio acolhedor dos desgraçados.
Qual fermento aumentando a minha dor,
inda sugas de meu sangue sobejante.
Ah! não fosse a bela lua,
quando cresce, quando cheia, quando mingua!
Ah! não fossem os dourados arrebóis,
os cri-cris do meio dia,
o esvoaçar das aves na contrabrisa!
Ah! não fosse o sujo rio, dormentio;
o azul do morro lá ao longe!
Ah! não fosse esse espelho de Deus trino,
mundo novo, sempre vivo!
Meu pó já estaria no deserto,
quem dera, com o vento,
irritando a bela Lia.
Lia... sabe alguém se ainda vive!
Se acaso lembra o mísero vivente!
Pode ser que, agora arrependida,
peregrina, ande à busca do demente.
Quem sabe saibas, Só?!!!
Pudera, se, quimera, tu devoras sofredores?
Por favor, vamos, responde!
Onde vaga a bela Lia?
Trás-os-montes?
Pelo Olimpo?
Por que prados?
Tens medo de perder-me, velha Só?
Ou, quiçá, a bela Lia?
Inconsciente, eu a vejo todo dia,
qual donzela lacrimosa
na esperança de encontrar-me.
De mañhã
ou à tardinha,
ela olha a pradaria,
quando inverno,
se outono,
muito mais na primavera,
e não vê o peregrino.
Mesmo às núvens ela indaga
se não trazem em seu bojo um Severino.
Sabes de mim, sabes de Lia
e sobre ela não me contas, velha Só.
Tu me amas com egoismo,
por isso te detesto.
Te despeço doravante:
deixa vago o coração deste demente!
Macia quero a alma, qual a névoa,
jamais dura como a pedra.
Rua, Solidão!!!
Vou atrás da bela Lia,
retomar das lindas rosas,
renovar meu coração.
Plastificarei as rugas de meu rosto envelhecido.
Pra meus cabelos vou roubar a cor da noite.
Vai-te, Só, nunca mais voltes!
Rir-me-ei de ti um dia,
quando Orfeu, do Universo, em sua lira,
dedilhar ao coro angélico
a mais bela melodia
e eu, louco de ternura,
oscular ardentemente
a face pálida de Lia.

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