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sexta-feira, 20 de outubro de 2017

É no poema


dema

É no poema que rezo meu credo,
proclamo amor, incrimino maldade,
canto beleza, ternura, amizade,
enalteço paixão, grito teu medo.

É no poema, que eu brado meu ódio
ante qualquer tipo de covardia,
se só a bondade é digna de pódio,
o mal, sequer, existir, deveria.

É no poema que choro o destino
de quem jamais soube o que é ser feliz,
pois, declinado do plano divino,
seguira, na vida, o próprio nariz.

É no poema que a ti me declaro
uno minh’alma co’a que te tomei;
na profusão de prazer sem reparo,
visto meus versos com trajes de rei.

Ébrio, aspiro o perfume das flores,
invejo-te o néctar, qual colibri;
expilo fel sofredor dos amores,
se acaso me queres longe de ti.

Sorvo da dor que carregas no peito,
da solidão estendendo os teus dias,
da vil saudade a roubar-te o  direito
de um coração vertedor de alegrias.

É no poema que mato a saudade,
como também nele te denuncio.
É no poema que castro a maldade,
salvo o amor de morrer por um fio.

É no poema que sonho acordado,
faço da noite uma só fantasia;
busco tecê-lo sempre arrematado
co’a joia mais fina, a poesia.









EM DEMASILVA

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Devagar


dema

Tem-se, ora, disponível todo o tempo
para medir e acompanhar o próprio tempo.
Vê-se espaçar-se o tic do tac.
Sem pressão, a corda perde força
e o mundo gira mais devagar.
Cabem, assim, mais pensamentos e lembranças no minuto.
A nuvem desliza no espaço lentamente,
desforma-se e reforma-se,
um feitio novo por redesenho.
O colibri acelera o bater de asas e adeja no ar trêmulo de primavera.
O néctar mela o bico e a flor se dobra.
Grupo de incontáveis formigas céleres
desloca morosamente o enorme inseto pela trilha.
O cão esparramado sonha no piso frio da varanda.
Se passarem as horas da tarde alongada,
talvez chegue o amanhã.
Pena que sonolento também esteja o estro,
ou dezenas de poemas nasceriam.
É a paz de alma em calmaria,
da consciência indolor,
vazia de motivos de remorso.
É o tempo se dando tempo
no azáfama contemporâneo.
É a vida gota a gota
a perenizar efemeridade.

EM DEMASILVA