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terça-feira, 27 de agosto de 2019

Ciclicidade



dema

Voltarão as chuvas e o verde.
Não se sucumbe a esperança à fé inconstante.
Vão-se os dias, os anos, mas, enquanto houver sol,
seguir-se-ão outros.
O ódio nasce, cresce, mata e passa. Ressurge, depois passa.
O amor enraíza-se.
O humano, indubitável. O divino, talvez.
A flor convida ao encanto,
o colibri aproxima-se e a beija.
O vivo consome-se ao fogo, renasce pela água.
Do céu, estrelas testemunham transas noturnas
de carinho e de maldades.
Sente-se no ar um aroma de vida e um olor cinza de morte.
Envolvem-se, todavia, não se confundem.
Cada ser no seu quadrado cíclico.


Aglomerado



dema

Acordei de madrugada
um tanto quanto encucado
com o peso cotidiano
de viver no aglomerado.

Sei que há muita coisa boa,
vivo na grande cidade,
mas, nos pratos da balança,
pende o da dificuldade.

Fila pro caixa do banco,
também do supermercado;
fila pra pegar o ônibus
e o metrô que vem lotado,

porém a maior das bichas
é a dos desempregados;
quando na hora do rush,
trânsito é engarrafado.

Ai, meu deus, que correria
pro trabalho e para escola,
ao chegar o fim do dia,
o cansaço me assola.

Já pensei mudar pro campo,
desfrutar da natureza,
ver brilhar o pirilampo
e o luar, oh que beleza!

Por outro lado, entretanto,
o tumulto da cidade
traz até um certo encanto,
não direi felicidade.

Sei apenas que me laça,
que me prende e que me abraça,
não mui raro me extasia
e amaina a minh’agonia.



terça-feira, 13 de agosto de 2019

Insipidez



dema


Teria sido a seca no Norte
que matou a minha inspiração
ou as águas sobejas no Sul
que afogaram o meu coração?

Onde está o silêncio da noite,
onde os segredos da madrugada,
o gorjeio festivo das aves
que enchia de encanto a alvorada?

Não vejo, há muito, a lua no céu
nem luzir de estrelas no sem-fim;
o sol, sempre escondido nas nuvens,
como se, na mata, um curumim.

Não se sente o perfume das rosas
ou o cheiro doce do jasmim;
nem se vê o beija-flor adejante
que trazia esperanças a mim.

Não mais me chegam ternas lembranças
dos amores que tive na vida;
tenho minh’alma empalidecida
por tanto sofrer desesperança.

Eis porque, ao nascer qualquer verso,
vem com insipidez, sem beleza.
Por Deus, quem dera fosse o reverso
para aniquilar essa tristeza!