terça-feira, 23 de outubro de 2012

Sal insosso


dema
Pra que serve o sal sem sabor
ou a lua sem o luar?
O que é a vida sem o amor
senão a morte sem nos levar?


Se...


dema

Se já não tens o meu sorriso
nem de minh’alma és mais a dona,
faze, pois, logo o que é preciso,
parte pra longe e me abandona.

Não partirás meu coração,
mas vais tirar meu sobrenome.
Farei por ti uma oração,
enquanto tua imagem some.

Onde a ternura que jorrava
desses teus olhos à mão-cheia?
Onde o carinho que emanava
dos teus afagos sobre a areia?

Que seca esta que permeia
nossos contatos de armadura,
como se bem tecida teia
com tantas garras de amargura!

Que vultos esses indistintos
em nebulosos movimentos!
Não sei se sentes o que sinto,
se é apenas coisa de momento.

Se há zarpado da vida a dois,
do amor que a sustentava, o elã,
não tem porquê crer que depois
seja possível outro amanhã.

Se só o que resta é grande dor
pelo de bom que antes houvera,
melhor se faz, com festa e flor,
brindar u’a nova primavera.

Se ao partir, levares o sol,
deixa a lua, porém, comigo;
terás sempre teu arrebol
e o luar será meu castigo.
..

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Giros e orbitais


dema

Cada giro um dia,
orbital um ano.
Se por sorte,
se por engano,
viu a luz,
traçado o plano.
Menino pobre,
mas “menino homem”,
não era tolo,
não passou fome.
Deixou o ninho inda bem cedo,
aventureiro, sem medo.
Dedicou a Deus doze orbitais,
fez dos amigos irmãos e pais.
Enveredou-se pelas humanas,
sobremodo greco-romanas:
Sociais e Filosofia,
História e Geografia,
até um pouco de Teologia;
depois Direito e pós-graduado,
mas não mestrado.
Mais uma dúzia de translações
consagradas à sociedade:
regeu discentes,
regeu escola;
o salário, quase esmola,
mais parecia ser caridade.
Com esposa e filhos, não havia jeito,
era preciso mudar de eito,
trocou de ofício com sacrifício.
Cobrar imposto, ah, que coitado!
“Isso é pesado, é pra Zaqueu,
mas se alguém o faz, que seja eu” _ dizia _
“Se não o fizesse, outro o faria”.
Que o Senhor seja louvado!
Ganha amigos, outros irmãos;
é respeitado, de coração.
Bodas de prata neste mister
marcam o giro de dar adeus,
rezar com fé e agradecer
a Deus e aos amigos seus
ora se impõe por gratidão,
sinceridade e obrigação.
Esquecê-los, jamais,
dizer-lhes apenas: “até mais!”
Quem sabe elípticas ainda restam,
como também outros devaneios
em seu caminho inda a trilhar
antes que cheguem últimos “ais”
do pré-traçado e abraçado fado.
Por ora, amigos, deixa o abraço,
diz “Até mais!”
sem rituais.

 


terça-feira, 9 de outubro de 2012

Negaça

dema

Aguardo teu cio,
felino, te negaceio.
Tua vida,
minha sobrevida.
Darwin me diria “sim”.
À caça da presa,
te espreito, me reteso,
armo o pulo.
Não passas,
sorte tua,
meu azar.
Farfalhas na verde folhagem da vida-arvoredo,
tenho nas mãos o teu medo,
tua inocência;
quero o teu segredo,
sem clemência.
A fortuna te agracia,
mas chegará a hora, o dia,
do salto, o momento,
pra matar-te com profundo sentimento
e fantasia.
Far-te-á vítima a paixão
que a mim maltrata.
Por inteira, tomar-te-á,
te domará.
De tua algoz à sempiterna companheira.
Perpétuo fará teu sacrifício.
E tu me tomarás em posse,
aos poucos, em domínio.
Ter-me-ás em propriedade plena,
algozes e vítimas em recíprocas,
inferno e céu,
desnudos de solidão,
imersos no tempo da eternidade,
sucumbir-nos-emos.
...

sábado, 6 de outubro de 2012

Nada e ninguém


dema

Sou nada,
sou ninguém.
Para mim a vida vai,
pra você ainda vem.
Não sei se vou levando a vida
ou se ela é quem vai me levando;
se me leva é direto pra morte,
que parece se achar me esperando.
Preciso contar com a sorte,
não ser pego de surpresa;
quero olhar nos olhos dela,
quero ter toda a certeza.
Se me busca a morte agora,
juro, não terei tristeza,
não joguei a vida fora,
vivi-a com profundeza.
Se o que fui vale mais nada,
menos vale o que ora sou;
sem futuro, sou piada,
sem passado, o que restou.
Para mim a vida vai,
pra você ainda vem,
e o que sou é ser um nada,
ser um nada é ser ninguém.